quinta-feira, 1 de abril de 2010

Tua Cara

Nasceste da lua, veio já pronto
Voou antes mesmo de andar
Sem vírgula nem ponto.
És uma exclamação na pergunta
Não espalha nem junta
Um coração através do espelho
Que nunca esconde o rosto.
Da cartola, o coelho
A surpresa, o espanto, o gosto.
Vem cantando, chora quando quer
Vai sumindo sem nunca deixar.
Um homem nada comum
Encanto do simples
Encontro de águas
Páginas de prazer na linha da vida,
palma de minha mão.
Fazedô de canção...vaidade do Pavão.
Maestro de uma orquestra particular
Que guarda no coração.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Tempo de Cheia




Nunca mais tuas marés
Mansas, salgadas/doces
Verão a primavera quente
Que sem reserva entreguei.

Nem mais o cheiro desprendido
Inexplicavelmente do corpo:
Plácido embora ávido, sentirei
Tudo trama sem qualquer sentido

Anseios, animais virgens insanos
Alçaram vôo de estréia, vertigem
Roupas, trapos ou finos panos
Leva tudo pra viagem!

Corpo "só" vê abrigo em qualquer estalagem

Hora de voltar pra casa
Fazer curativo e repouso
Consertar minha asa
Quebrada em forçado pouso.

quinta-feira, 18 de março de 2010

Estado Interessante




Dia quente, nada de chuva. Nessas tardes de preguiça vem sempre uma idéia de ir embora para uma outra terra menos árida.
Daí é só dar linha que o pensamento toma corpo e sai viajando por aí. São tantas as possibilidades que essa idéia logo acaba se perdendo e dando lugar a alguma outra divagação qualquer. Uma pessoa, uma música, um encontro ou desencontro que ficou no passado.
Cansado disso, o corpo pede um copo d'água e agora satisfeito volta a elucubrar (palavra feia, né?).
A cama está macia...os olhos vão baixando a guarda lentamente. As paredes do quarto parecem derreter junto com os quadros e tudo mais.
Entro em estado de torpor. Nesse estado "interessante" é quando as fantasias começam a ficar mais ousadas. Já não desejo ir pra Índia, mas estou lá! Depois de perceber que o calor também é insuportável, decido pelo Alaska: Choque térmico.
Acordo do devaneio e descubro por baixo da neve recém sacudida uma tatuagem do Buda.

domingo, 14 de março de 2010

Historieta

Soletrar teu nome
contando estrelas
Despir os temores
Matar a fome.

Profunda e íntima
Revirar suas gavetas
Trem desgovernado
Sem dar a mínima

Conhecer teu travesseiro
Sentir-lhe o cheiro
Misturar suas roupas
Com as minhas poucas

Sem pressa,
Sentir somente
Esquecer promessas
De estrela cadente.

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Divã




No fino do traço
Estranho contraste
Daquilo que diz

Reviro na mente
Te busco no mundo
Contente, infeliz

Timbre semelhante:
Espelha um instante.
Falsete ou farsante?

Vesti tua alma
Num outro corpo,
Desejo gigante.

Por trás da tua lente
O castanho dormente
Me conta que errando,
Eu quase acertei
Freud diria que sonhei.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

CON_TRATO

Tenaz vem teu corpo sobre mim
Seios de argila em tua mão
Boca revira lingua carmim
Esfera e reentrância...vão.

Coisa vivida sobre lençóis e certeza
Sabe perfeito minhas dúvidas, recado
Sorve como algodão doce a pureza
Em ti, sou cortesã, ninfa e pecado.

O banho tomado, alecrim
Você de saída, suado
tudo acabando em(n)_fado
Terremoto em mim.

Voando Alto
Publicado no Recanto das Letras em 29/06/2009
Código do texto: T1673017

COITO (Dé Fernandes / Carla Lopes)



Untados de areia e mel
Estrela com caracol
Do céu que se faz dossel
Desprezam lua e sol

Estranhos julgam mal
Desdenha quem gostou
Da sede do casal
Do sal que transpirou

Pasmados entram no cio
Molhados de sensação
Invejam o coito vadio
Providos da tentação

Adoçam todo o mar
Plenos já são além
Saciados do amar
Que neles é refém

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Pé na Estrada




Há muitos fantasmas por aqui
Fazem barulho, ruídos profanos
Há muito passado nesse presente
Não se deixam enterrar, insanos!

Mexem em tudo, reabrem feridas
Fantasmas de noiva, noviça e soldado
Nascem de novo a cada partida
Falam na cara, não mandam recado

Confusa caio em contradição
Desejo o novo, anseio seguir
Mas me pega o fantasma da tradição
Feito a mulher que vive a fingir

Se me vem o sucesso, há que se comemorar
Abrir os trabalhos, coragem e mãos a obra!
Mas me chega o fantasma de não se orgulhar
Contenta menina, com aquilo que sobra!

Cara de boba, parada no caminho
Encruzilhada, fim de estrada
E agora onde vou, se nada sobrou?
É longa viagem, junta a bagagem: Sua hora chegou.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Esperando Ulisses



Se não te vejo fica o desejo
Insiste em visitar, incomoda o peito
É fome na boca saudade do beijo
Precoce, recém nascido posto no leito

É presença forte, tem loucura latente
Mapeia, investiga e tortura sem doer
Energia constante, gozo ainda semente
Esperando gigante a terra romper


Temperatura constante, a dor latejante
de um sonho desfeito em noites de festa
Lágrimas invisíveis, peito ofegante
Aconchega em mim, ilusão honesta

Eu te recebo, dor, eu te recebo amor
Prometo te cuidar e querer bem
Te espero, há de chegar com esplendor
Então da minha cama te farei refém.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Clarão

Você em minha vida pode mudar tudo
Pode não mudar nada, pode me amar
As vezes vai odiar, vai querer voltar
Você em minha vida,
Pode me fazer esquecer o vício
Ou me viciar em coisas mais
Você em minha vida
Pode me dar um filho, uma planta
Um mapa ou um planeta.
Teu olhar me diz que sim
O peito reluta, quer outra conquista
Você em minha vida, delírio de artista!
Noturnos viajantes do universo pensante.
Você em minha vida...
É a pele queimando, é o dia morrendo
e a noite chegando.
É vida engolindo a morte, o desejo
vencendo a sorte.
Você em minha vida, o mundo se abrindo
O clarão penetrando, que seja bem vindo
Você em minha vida, presente de véspera
O tom que faltava, tenor da minha ópera
Que nunca cantei.
QUADRILHA

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Carlos Drummond de Andrade

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Palhaçada!!!



Que fazer se as palavras vão embora,
Logo ali um pierrot sorrindo chora
Chora escorrido e borrado, sem trocado
Surpreso vê sambando um corpo suado,

Pierrot em desalinho a lágrima enxuga
Se põe a pensar, decide pela fuga
No encalço da moça, beleza quente
Arrasta os sapatos, cansado e carente

Se vira no salão, gorjeta do patrão
Sem colombina, perdeu na repartição
Virou palhaço, prefere o nó ao laço
Sem a papelada, correu pro abraço

Moça já vai longe, Pierrot se cansa
No meio na rua perde a esperança
Finda noite engolida em raios de sol
Um sinal vermelho de sangue no farol.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Só_risos rasos



Valendo-se de alguma vantagem da mãe natureza
Segue toda certa ignorando o espelho sem surpresa
É dia, é noite ou madrugada acorda louca despenteada
Procura as chaves e o senso pelo apartamento:
Tem coisas espalhadas pelo chão, arrependimento.
O que sente? parece um alívio pelo dia que nasceu.
O sol acena com o brilho cego queimando a retina
De repente se lembra do menino, na pressa esqueceu
Esqueceu a promessa de "sou tua, seja meu".
Coisa de menina!
Chega atrasada, estabanada derruba o café manchando a blusa
Confusa!
Logo aparece a danada da vaidade, tirando qualquer possibilidade
de amadurecer.
No espelhinho do estojo, junto ás sombras uma boca que ri sorrisos
desconexos, lembrando sem pudor o sexo já refeito que aguarda.
Que espera ela? Quem a espera?
Dois pólos ou mais...um risco de coincidência quem dera.
Menino? Virou homem, viajou no tempo, virou brisa e estrela.
Menina? Passou do tempo, caiu do pé. Perdeu a pose e nem deu tempo para um último close!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010



Helle_mentos

Ah, essa ânsia da mulher!
Esse "quê" de vontade de você
Se fores brisa, nuvem quero ser!
Estrela quiçá se um dia puder
Dessa que brilha no céu particular
da boca que canta bossa, canta
samba e tudo que vier.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Convite


Convidei para entrar em minha vida,
Servi meu coração em bandeja de prata,
e o corpo em cama de gato que fiz pra mim.
Disse: Sirva-se á vontade, deixe-se ficar,
cuido de tudo e não se preocupe em voltar.
As portas continuarão abertas.
Enganei meu coração fingindo brincar
Agradei o teu isentando dos encargos, enfim
Nem me pediste pra armar a festa, mas eu sou
mestre de cerimônia por nascimento.
Sem amarra, sem espera, sem troco.
Só eu e você
Você
Eu.
Nós?

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Asas e Notas


Pequeno na estatura, gigante na alma
Cantando costura e cura feridas
Palavras vencidas, tiradas da palma
Entregam-se a ele, deveras vencidas
Afaga os amores
e se refaz
Afoga suas dores
num copo de paz
O violão já vestido, o abraça por trás
Caminha tranquilo, um aceno de mão
Dono de si, assovia notas em tardes lilás
Desenha o caminho com pena e carvão
Um anjo lhe segue e dele se apraz
Perturba as estrelas brilhando demais
Doce menino, sabe o que faz
Vai pela vida, seguindo os sinais.

Processo


Diminuir a vida? dar espaço? abreviar o tempo?

Negar, protelar, fingir, dissimular?

Pedir licença, alvará, pagar imposto?

Calar a boca...ser elegante, dar a preferência?

Tolerante, altruísta, nobre, patético...

Brasileiro?

Acostumado, acomodado, domesticado.

Vai trabalhar!

Manda a enxada na terra, pega o vale transporte,

o bolsa família, e guarda no bolso!

Chega ferrado, de dentes trincados, chuta o traseiro

do filho da mãe...bebe sua pinga derrete a revolta,

canta vitória do tricolor acordando o vizinho de trabuco na

mão.

Dorme enfim descansa a carcaça no cemitério de São Sebastião.

Como pedir medida, enganar a memória?
Se quando lhe falta dedos, com a boca me conta
o por que dessa falta, começo de história.